Mariana Kotscho
Busca
» SUA HISTÓRIA

Quantos pedidos de socorro serão necessários até que você seja amparado?

Ivana Andrade conta a história de quando pediu socorro e os médicos só conseguiram identificar corretamente a sua doença tempos depois

Redação* Publicado em 24/11/2023, às 15h08

Ivana Andrade, 33 - Foto: arquivo pessoal/ Ivana Andrade
Ivana Andrade, 33 - Foto: arquivo pessoal/ Ivana Andrade

Aos 12 anos, Ivana Andrade, hoje com 33, começou a passar por por todos os tipos de médicos e fazer acompanhamento psicológico para tentar entender o que havia de errado: estava sempre mais cansada e não entendia ao certo os motivos de não conseguir acompanhar o rítmo dos colegas, inclusive, nos momentos de diversão.

O diagnóstico era sempre o mesmo: depressão e ansiedade

Por muito tempo, ela acreditou que fosse apenas isso. Por volta de 2014, ela teve uma piora abrupta em seu quadro clínico e ficou cerca de quatro meses de cama. Os batimentos cardíacos chegavam a 160, pelo simples fato de ficar em pé. Ela sentia náusea, dificuldade de raciocínio, dores e fadiga extrema. Então, trancou o curso de design e parou de trabalhar com fotografia. 

Nessa época, passou por mais de 10 médicos e nenhum deles transmitia a confiança de realmente saber do que se tratava, afinal, os exames se apresentavam aparentemente normais. Em 2015, ela chegou ao diagnóstico de Encefalomielite Miálgica, vulgarmente conhecida como Síndrome da Fadiga Crônica, o que foi confirmado pelo médico Dr. Luís Nacul, pesquisador brasileiro e referência mundial no assunto, que trabalha em um hospital de Doenças Complexas no Canadá. 

Veja também

Ivana percebeu que, enquanto não houvesse um trabalho de conscientização sobre o tema no Brasil, a realidade desses pacientes não mudaria. Assim, ela se tornou uma ativista por incentivo a políticas públicas para pacientes com Encefalomielite Miálgica. Por mais que a estimativa seja de ao menos um milhão e meio de brasileiros com essa doença – sem contar os pacientes com sequelas de fadiga pós-covid –, a luta é silenciosa e solitária. Não é por acaso que, você que lê este artigo, provavelmente nunca ouviu falar a respeito. 

Um passo importante para aumentar a conscientização e conquistar apoio do poder público foi dado no último dia 14, quando pacientes, ativistas, médicos e pesquisadores, membros do Ministério Público de Goiás, jornalistas, desembargadores estaduais e federais se reuniram com representantes do Departamento de Atenção Especializada e Temática (DAET) do Ministério da Saúde. Curiosamente, nem mesmo os representantes da pasta não sabiam da existência da Encefalomielite Miálgica. 

No encontro com o Ministério, a jornalista Mariana Ceratti teve a oportunidade de apresentar as condições do irmão mais novo, o estatístico Rubem, 36 anos, gravemente doente há oito. Estima-se que ao menos 25% dos pacientes com Encefalomielite estejam em condições clínicas severas. Por causa da doença, ele atualmente está em cadeira de rodas, não fala e se alimenta por meio de uma gastrostomia. Além disso, os médicos Luís Nacul, Rudolf Oliveira e Eliana Lacerda ministraram uma aula a respeito do tema. 

Agora, os ativistas terão que encontrar uma Sociedade Brasileira de alguma especialidade médica disposta a estabelecer Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT). É lamentável registrar que, para a grande maioria dos médicos brasileiros, essa doença simplesmente não existe.

Por mais que em alguns países existam bancos de pesquisas voltados especificamente para o assunto, além de centros especializados no atendimento desses pacientes e políticas de conscientização e investimento em pesquisas, no Brasil ainda dependemos dos poucos pacientes que usam da escassa energia que possuem para expor essa realidade e implorar pela instituição de políticas públicas, porque eles sentem na pele o que é viver com uma doença marginalizada. Mas pior do que isso é assistir a pacientes, em condições extremamente graves, sem o amparo adequado do sistema de saúde. Esses sim são os verdadeiros invisíveis para a sociedade, para o sistema e para o Estado, porque na maioria das vezes eles não conseguem procurar ajuda, quem dirá expressar a sua indignação.