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Alertas para o falso diagnóstico da Dislexia

Por que o falso diagnóstico de transtornos do neurodesenvolvimento pode comprometer o desenvolvimento de crianças, com impactos na fase adulta

Juliana Amorina* Publicado em 29/02/2024, às 06h00

Entenda as diferenças entre Dislexia e Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade
Entenda as diferenças entre Dislexia e Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade

Um dos principais fatores que pode interferir no desenvolvimento da criança nos primeiros anos de vida, e até comprometer o seu aprendizado quando se chega à fase adulta, é o diagnóstico equivocado dos transtornos do neurodesenvolvimento. Atualmente, tem sido muito comum confundir a Dislexia com o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), por exemplo, porque são condições que compartilham alguns sintomas e consequências, resultando, ocasionalmente, em falsos diagnósticos.  Embora sejam consideradas as causas mais frequentes para o mau desempenho acadêmico, na Dislexia, a dificuldade se concentra em associar sons com letras, impactando a habilidade de ler e escrever. Os indicativos para o transtorno são: dificuldade em aprender as letras do alfabeto, falhas na associação entre a letra e o som que ela representa e atrasos no desenvolvimento da leitura - sendo a leitura lenta um sintoma específico da Dislexia. Já no TDAH, há uma baixa capacidade de concentração e de manutenção do foco, ou seja, a pessoa se distrai facilmente. Em crianças, a hiperatividade pode ser evidente, enquanto em adultos, predominam os sintomas de desatenção.

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Nos transtornos da aprendizagem, como a Dislexia, a desatenção pode ser percebida independente do diagnóstico de TDAH. Isso ocorre, sobretudo, quando o indivíduo está fazendo algo que é particularmente difícil, pouco prazeroso e pouco motivador. Importante ressaltar que a comorbidade entre os dois transtornos é alta, entre 31% e 45% dos casos. Quando o tratamento do TDAH acaba não refletindo em alguma melhora no desempenho acadêmico, uma das primeiras coisas em que o deve-se avaliar é a possibilidade de existir comorbidade associada à Dislexia.

Diante da complexidade que envolve o diagnóstico da Dislexia, torna-se crucial fazer uma investigação completa, de forma individualizada. Por isso, a importância de buscar ajuda de profissionais especializados tão logo seja percebido algum sinal. Na maioria das vezes, equipes multidisciplinares, que reúnem médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos, fazem uma avaliação cuidadosa para identificar corretamente o transtorno do neurodesenvolvimento e apontar os tratamentos adequados.

Somente com uma análise aprofundada é possível ter um diagnóstico preciso, permitindo estratégias de intervenção eficazes que ajudarão a entender melhor como lidar com as dificuldades de aprendizado associadas à Dislexia, evitando assim que a criança enfrente problemas mais sérios ao ser diagnosticada de maneira incorreta. O diagnóstico correto da Dislexia contribui para a construção do bem-estar e da autoestima.

No Brasil, embora os desafios sejam inúmeros para o acesso ao diagnóstico e ao tratamento da Dislexia, tanto no âmbito público quanto no privado, poucos sabem que o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece recursos disponíveis a toda população que busca por esses diagnósticos. Além de diversas universidades que, em conjunto com o SUS, realizam a avaliação diagnóstica da Dislexia, promovendo acompanhamento individual e análises de equipes multidisciplinares. Para facilitar esse acesso à rede pública, o iABCD produziu um guia com o passo a passo de como procurar um diagnóstico no SUS.[LM1] 

Infelizmente, esses transtornos ainda não são possíveis de serem identificados por meio de marcadores biológicos, sem eventuais chances de captá-los por exames laboratoriais ou de imagem. Dessa forma, o diagnóstico depende de uma boa avaliação clínica que envolve a aplicação de questionários, inventários e testes/avaliações padronizadas para determinar a presença e gravidade dos sintomas em um paciente.

À medida que a Dislexia e o TDAH são temas cada vez mais conhecidos na sociedade, o excesso de informações — nem sempre precisas ou cientificamente comprovadas — percorre uma linha tênue entre a força que elas trazem para o avanço na identificação do tipo de transtorno e a falta de credibilidade que pode vir associada, o autodiagnóstico é um dos maiores erros e causas para a perda de confiabilidade.

É evidente que diagnósticos equivocados podem ter sérios reflexos no desenvolvimento infantil e na vida adulta. A sobreposição de sintomas entre esses distúrbios torna essencial uma abordagem individualizada, além de uma investigação completa por parte de equipes multidisciplinares especializadas. E apenas por meio de um diagnóstico preciso é possível implementar estratégias de intervenção eficazes, garantindo o bem-estar das crianças impactadas.

Sobre o Instituto ABCD

O Instituto ABCD é uma organização social sem fins lucrativos que se dedica, desde 2009, a gerar, promover e divulgar conhecimentos que tenham impacto positivo na vida de brasileiros com dislexia e outros transtornos de aprendizagem, com o objetivo de garantir que todos tenham sucesso na escola, no trabalho e na vida.

*Juliana Amorina, diretora-presidente do Instituto ABCD